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Little Tomodachi (ともだち)

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29
Out22

A história do livro queimado pelos nazis — e que deu origem ao novo épico da Netflix

Niel Tomodachi

"A Oeste Nada de Novo" é a mais recente adaptação da obra que revelou os horrores da I Guerra Mundial.

Quando foi lançado em 1929, “A Oeste Nada de Novo” tornou-se rapidamente no maior sucesso da literatura alemã. Passara uma década do armistício que pôs um fim à I Guerra Mundial e as marcas do conflito ainda estavam bem presentes.

Enquanto meio milhão de alemães compraram a sua cópia nos primeiros meses de venda, outros tantos compatriotas mantiveram-se de pé atrás. Os membros do novo partido Nacional Socialista, que se encontrava em ascensão, duvidavam das intenções do autor, Erich Maria Remarque.

A sua campanha assentava no orgulho nacionalista alemão. Queriam ver a glória do país restaurada e a vergonha da derrota na última guerra apagada. O livro, um testemunho dos horrores vividos na guerra das trincheiras, era uma pedra na máquina da retórica nazi que, eventualmente, levaria Adolph Hitler ao poder.

Remarque, naturalmente, tornou-se num alvo a abater. Foi acusado de ser judeu. De não ter realmente combatido no exército alemão. Valeu de tudo até conseguirem apagar as páginas da memória dos alemães. Quando chegou ao poder, Hitler baniu o livro. Mas não o apagou.

Nove décadas mais tarde, “A Oeste Nada de Novo” continua a ser uma obra marcante, contra a guerra, pela paz. A adaptação é uma produção alemã, dirigida pelo realizador Edward Berger, que chegou esta sexta-feira, 28 de outubro, à Netflix. No papel principal está um novato autor austríaco, Felix Kammerer, acompanhado de alguns nomes importantes do cinema alemão, como Daniel Brühl.

O filme é uma das grandes apostas da plataforma e também do cinema alemão, que já o aponta aos Óscares. Na verdade, não seria inédita a atribuição de uma estatueta a uma adaptação da obra de Remarque.

 

Um ano depois do lançamento do livro, “A Oeste Nada de Novo” era adaptado por Hollywood ao cinema pela primeira vez. Lewis Milestone realizou a longa metragem que recebeu quatro nomeações e conquistou dois Óscares em 1930, o de Melhor Filme e o de Melhor Realizador.

Na Alemanha, o filme foi inicialmente aprovado pela autoridade que garantia a censura estatal. Ainda assim, as sessões ficaram marcadas por inúmeros boicotes, apesar de atraírem ilhares de espectadores.

Grupos de nazis — a mando de Joseph Goebbels, o futuro ministro da propaganda — invadiram salas de cinema, destruíram projetores, soltaram ratos e pequenas bombas de mau cheiro. Tudo para evitar que o retrato tenebroso de Remarque da Grande Guerra atrapalhasse a retórica belicista de Hitler.

A exibição do filme haveria de ser proibida, com a justificação de que não estariam asseguradas todas a condições de segurança. Três anos depois, já no poder, Hitler colocava filme e livro na sua lista negra.

Erich Remarque, ao contrário do que acusava a propaganda nazi, nascera numa católica família alemã de classe operária. Tal como muitos dos seus colegas, tinha apenas 18 anos quando foi chamado para se alistar no exército e combater pela pátria.

A grande guerra decorria já há três anos, quando foi enviado precisamente para a frente de batalha a oeste, onde os germânicos combatiam as forças francesas. Lutou nas trincheiras e rapidamente sofreu as consequências de uma batalha sangrenta e impiedosa.

Acabaria por sofrer ferimentos que o obrigaram a retirar-se da frente. No hospital, foi gravando na memória os relatos dramáticos dos outros feridos. Manteve-se em recuperação até ao final do conflito, altura em que decidiu prosseguir os estudos e trabalhar como professor, antes de se aventurar como jornalista e editor. Foi também bibliotecário e até piloto de carros de corrida.

Em casa, passava o tempo entre as páginas, a exorcizar a experiência traumática nas trincheiras, a perda dos colegas e amigos, os traumas, o terror. Mais de uma década depois do final do conflito, Remarque tinha finalmente a obra terminada, uma espécie de tributo a uma geração que se perdeu entre a lama e as bombas.

Remarque morreu em 1970, na Suíça
 
 

Entre as vítimas estavam quase sempre jovens, muitos ainda em idade escolar, que entusiasmados com a propaganda do serviço à pátria partiam em busca da glória, apenas para perceberem que eram meros acessórios na máquina de guerra. O livro centra-se no jovem estudante Paul Bäumer, um dos tais jovens que se deixaram encantar pelos discursos patrióticos dos professores. Acaba colocado na brutal frente leste do conflito.

Nas páginas do livro, Remarque relata a carnificina das trincheiras, as noites de solidão e o tédio que assolava os militares nas aparentemente intermináveis horas entre combates. Uma prova que esmagava a ideia idílica de uma “guerra patriótica” e honrada pela pátria e que assustava os nazis, ansiosos por uma nova batalha.

Mas, para essa luta, precisavam de um povo motivado. Os horrores descritos pelo alemão não encaixavam na narrativa. O sucesso nas vendas e a premiada adaptação ao cinema obrigou o regime a tomar medidas drásticas.

Ao aperceber-se do que poderia acontecer, Remarque abandonou o país rumo à Suíça, precisamente um dia antes de Hitler ser eleito. Nos meses seguintes, “A Oeste Nada de Novo” tornava-se numa das obras a ser atirada para as famosas fogueiras, nas quais os nazis destruíam as obras censuradas.

Não ficaram por aí. As autoridades decretaram a remoção da cidadania germânica a Remarque, que se viu arredado do país até à derrota final dos nazis, em 1945. O livro, esse continuou a ser traduzido em dezenas de línguas e a ser lido por todo o mundo.

Em 1979, a obra foi novamente adaptada em filme, desta vez pela CBS, para ser transmitido na televisão. Mais de quatro décadas depois, o épico volta aos ecrãs, com uma mensagem que continua tão válida como há 90 anos.

 

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